Seminário reflete sobre concentração, poder e hegemonia da Globo


Por Joanne Mota

Fechando a maratona de atos de descomemoração dos 50 anos da Rede Globo, o Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé realizou, nesta segunda-feira (27), seminário “Rede Globo: 50 anos de poder e hegemonia”. O evento reuniu pesquisadores, estudantes e ativistas em torno a construção e consolidação do império Globo.

Dividido em dois momentos, o seminário debateu na parte da manhã a construção do império global que contou com a presença do professor César Bolaño (Observatório de Economia e Comunicação – OBSCOM), o professores da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ Marcos Dantas e professora Suzy Santos.

A segunda parte do seminário versou sobre o papel dos telejornais, com foco na produção da informação e na manipulação escancarada. Esse debate foi conduzido pelo Luciano Martins Costa, editor do Observatório de Imprensa, e a jornalista Laura Capriglione, do Movimento "Jornalistas Livres" e site A Ponte.

Mercado oligopólico

Durante sua fala, Bolaño destacou que os impactos da Rede Globo no campo da cultura e seus reflexos no desenvolvimento do país. “Ao ser criada, a Globo rompe com o modelo concorrencial. Somente com a Globo é que observamos a institucionalização de um mercado oligopólico de TV. É com ela que a cultura brasileira é empacotada e transformada em mercadoria”, salientou.

Segundo ele, “a Rede Globo consolida uma visão de mundo, modelando gostos, empacotando a audiência, que é o seu real negócio. Ao enraizar seu padrão de qualidade, ela [Rede Globo] realiza um movimento estratégico o qual barra a entrada de outros capitais no mercado”.

Comunicação, cultura e desenvolvimento

Na mesma linha, a pesquisadora Suzy Santos atualizou que hoje a Rede Globo se constitui como Grupo globo, que comporta a Rede, Fundação Roberto Marinho, espaços de representação (globo universidade, globo ciência, etc). Ao falar da relação da Rede com o campo político, Suzy Santos falou da posse ilegal de concessões por parte de políticos, o que denominou como “coronelismo eletrônico”.

Ela também falou da importância e desafio de se estudar a estruturação do mercado de televisão no Brasil. A ausência de informações sobre a concentração da mídia e de suas relações com o campo político dificulta o processo de construção do real impacto da rede no processo de desenvolvimento do país, especialmente, no processo de consolidação das noções de cultura e comunicação enquanto vetores do processo”.

Padrão alternativo, qual buscamos?

Ao avançar na reflexão, Marcos Dantas destacou a importância de, diante a concentração e poder da Rede Globo, pensar caminhos alternativos para enfrentar essa conjuntura. “Pensar alternativas precisamos refletir sobre uma série de questões centrais e complexas”. E destacou a contribuição do Relatório MacBride, que já ali propunha o desafio de universalizar a cultura, pensar a comunicação de um ponto de vista estrutural e sua influência com no desenvolvimento.

Dantas destaca que “numa sociedade capitalista, a apropriação dos bens se dá nos marcos do sistema vigente. Os meios de comunicação de forma geral servem ao capitalismo. Esse sistema de comunicação desde que foi criado, lá pelos idos dos anos 1920, tem como principal objetivo construir uma sociedade de consumo, de venda de mercadorias”.

E completou: “Como quebrar o padrão ideológico instituído pelos grandes players da mídia? Como fomentar o pensamento crítico no seio social?”, questionou o pesquisador ao aponta a complexidade de pensarmos alternativas ao sistema.

Fonte: Barão de Itararé

Descomemoração da Rede Globo: 50 anos na construção de um império

Foto: Érica Aragão
"A Globo teve relação profunda com a vida política brasileira", diz Suzy Santos

Para continuar a “Descomemoração dos 50 anos da Globo”, Barão de Itararé e Observatório de Economia e Comunicação da Universidade Federal de Sergipe realizaram hoje (27) o  seminário “Rede Globo, 50 anos de poder e hegemonia”. Com apoio da CUT, CTB, FUP, CONTEE, Fundação Perseu Abramo e Fundação Maurício Grabois, o encontro contou com a participação da Renata Mielli, do Barão de Itararé, que coordenou o debate, dos professores César Bolanõ, da Universidade Federal de Sergipe, e dois pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Marcos Dantas e Susy Santos. O tema do debate foi “A construção do império Global”.

Desde o nascimento, há 50 anos, a Globo oferece ao seu espectador o consumo de um conteúdo hegemônico e elitista. Isso não significa que este conteúdo seja superior aos outros, mas que é seguido pela maioria da população e tem um impacto muito grande na vida das pessoas. Para César a entrada da Globo no mercado em 1965 teve um aporte capital, financeiro e de conhecimento externo. “O apoio ao regime militar lhe permitiu assumir posição particular no mercado”, afirma o professor.

O império da Rede Globo foi construído com incentivos públicos, isenções fiscais e outros benefícios conquistados pelo coleguismo com os militares governantes.  Fez de tudo para salvar o regime dos ditadores, apoiou abertamente as prisões, torturas e assassinatos no momento de grande repressão no País.

“A Globo teve relação profunda com a vida política brasileira, uso político de licença é bastante específico e forte.”, afirma Suzy. Quem indicou o primeiro ministro de comunicações do período democrático foi Roberto Marinho. “Talvez ele tenha indicado o maior quantidade de ministros”, completa ela.

César fala também do Controle do conteúdo nacional da TV Globo. “A emissora compra direitos de reprodução e produz articulando o máximo possível de produção independente pelo brasil. Assim ela garante a hegemonia”. Hegemonia de informação, esta que conta os fatos no ponto de vista da classe dominante e faz um serviço de desinformação quando se trata de movimento social.

Além da linha editorial da emissora que criminaliza a política e demonstra ser uma empresa séria, a Globo está envolvida em inúmeros casos suspeitos. Segundo o manifesto em repúdio ao autoritarismo da linha editorial da emissora assinado por várias entidades, até hoje a Globo não mostrou o DARF (Documento de Arrecadação de Receitas Federais) do pagamento dos seus impostos. Esta atitude reforça a suspeita da bilionária sonegação da empresa na compra dos direitos de transmissão da Copa do Mundo de 2002.

Outro assunto que é recente, mas tem herança de nascimento da Rede Globo é o caso do HSBC. Para Adriana Oliveira Magalhães, secretária de Imprensa da CUT São Paulo, a empresa tem interesses privatistas. “O jornalismo parcial demonstra que a Globo tem partido, ainda que tente dizer que é neutra. E além de ser acusada de sonegar impostos, cadê a cobertura especial para abordar os desvios ocorridos no HSBC e o nome da Lily como ex-esposa de Roberto Marinho?”, questiona. O caso HSBC que a dirigente cita é o caso recente em que houve vazamento bancário de depósitos feitos entre 2005 e 2007 por clientes HSBC, sonegadores e criminosos. Há uma lista de mais de 8 mil brasileiros que tinham contas numeradas na Suíca, no qual consta o nome Lily de Carvalho, morta em 2011. Ela foi viúva dos jornalistas e donos de jornais, Horácio de Carvalho (19608-1983) e Roberto Marinho (1904-2003). Mas veículos como a Globo e outros tradicionais relacionam a mulher, em todas as reportagens, somente ao primeiro marido.

É por estas e outras histórias que movimentos sociais e representantes da sociedade civil que defendem a democracia descomemoram os 50 anos da emissora.  Para o professor Marcos a Globo serve o Capitalismo, “eles pregam a construção de uma sociedade de consumo”, completa ele.

Fonte: CUT

Amplificada pela mídia, onda conservadora não vingará



Por Felipe Bianchi

Para os jornalistas Palmério Dória, Luis Nassif e Rodrigo Vianna, o recrudescimento conservador pelo qual passa a sociedade brasileira e que é intensificado pela mídia não vingará. Em debate que encerrou o II Encontro de Blogueiros e Ativistas Digitais, eles deixaram suas impressões sobre a conjuntura  e traçaram paralelos do atual momento com os anos de 1954 e 1964. No entanto, praticamente descartaram a hipótese de um triunfo golpista no país.

Rodrigo Vianna, autor do blog Escrevinhador, leu em voz alta uma citação e questionou os mais de 100 presentes a descobrirem a qual jornalista pertencia o texto. Reinaldo Azevedo foi o primeiro a ser apontado, mas o texto era de Carlos Lacerda, em forte ataque ao “governo imoral e ilegal” de Getúlio Vargas, como diz o trecho. “Acho que o cenário remonta até mais à essa época do que à 1964”, opina Vianna. “Os jornais estavam desesperados para derrubar Vargas, mas não tinham claro o que queriam, assim como a oposição partidária atual não tem clareza de qual projeto pode apresentar ao país”.


Ele lista uma série de semelhanças entre a atuação dos meios de comunicação àquela época e agora, como os ataques às medidas populares de Vargas, “que tachavam ‘peronista’”, como o aumento do salário mínimo e as leis trabalhistas e as políticas populares dos últimos 12 anos.

O próprio Fernando Henrique Cardoso, recorda o blogueiro, já disse que faz falta no Brasil um Carlos Lacerda. “Hoje tem uns cinco, dez, quinze Lacerdas fazendo essa agitação, mas não conseguem levantar debate porque só sabem fazer acusações histriônicas”, diz.

A comparação com 1964, de acordo com os debatedores, também é inevitável. O papel da mídia, que cercou o então presidente João Goulart, foi um dos elementos mencionados, assim como à classe média indo às ruas com um discurso histérico e extremamente moralista.

“O fato de não haver tanques de guerra na rua não significa que a democracia não esteja sob risco”, ressalta Vianna. “Mas não acho que essa barbárie vencerá a massa crítica e os movimentos sociais brasileiros, que têm instrumentos para equilibrar a balança”.

A crise dos jornais e o poder da Internet

Luis Nassif, do Portal GGN, recorre à história para elucidar o cenário dos meios de comunicação na atualidade. “Primeiro, amedronte o cidadão. Depois, tranquilize-o com um ‘cacetete de jornal’. Ou seja, crie uma ameaça fantasmagórica e desesperadora e, na sequência, crie super-heróis que ajudarão a matar o monstro. Essa análise, acreditem, é de um estadunidense em 1920”.

O poder da mídia, argumenta Nassif, está enraizado na lógica do ‘homem inferior’, o cidadão típico da classe média. “Esse cidadão é facilmente manipulado em momentos como o que vivemos hoje”, afirma. “O que move a maioria silenciosa é o desconforto com a situação. Como a mídia só mostra notícia negativa, causa grande mal estar, mas não vejo uma questão tão ideológica assim”, pondera. “É verdade que o Congresso que aí está parece não ter sido eleito para governar e, sim, para legislar, mas tenho reservas quanto a esse proclamado avanço da direita”.

Assim como a chegada do rádio no Rio de Janeiro provocou crise ao quebrar o monopólio dos jornalões, a Internet chacoalha as estruturas dos grandes grupos de comunicação, aponta. “A Internet é uma tecnologia que a mídia tradicional não pode controlar e, por isso, entram em pânico. Não existem mais barreiras de entrada, como existe nas empresas tradicionais de comunicação”.

Mais que a opinião pública, a democracia depende, fundamentalmente, da opinião publicada, defende Nassif. “São dois públicos básicos: a classe média estabelecida e os novos incluídos, sindicatos e movimentos sociais. Antes, o modo de divulgação desse segundo público eram os jornais, com os mimeógrafos. Agora, estão presentes na Internet”.  

Os jornais, conforme argumenta, perderam a supremacia da audiência. “São os mais fortes, mas não têm o mesmo poder”, dispara. “Essa bronca com os blogs e as merrecas que recebem só serve para pressionar pela redução do ritmo de publicidade na Internet, que acaba dirigindo todo o dinheiro para a Globo e para a TV aberta”.

Palmério Dória, autor de ‘O Príncipe da Privataria’, também mostra entusiasmo com o fortalecimento da blogosfera e das mídias alternativas no cenário digital, mas critica a inércia do governo em tomar medidas para democratizar o setor. “Lula e Dilma não fizeram o dever de casa. Não dá pra ficar esperando de braços cruzados o governo entrar na questão fundamental da regulação da mídia”, assinala. “Somos todos reféns da grande imprensa, como mostra esse movimento de rua das elites, provocado e amplificado pela mídia”.

Com vasto currículo na imprensa, inclusive nos meios alternativos, Dória lista algumas de suas parcerias ao longo da história, como um programa de rádio com Lúcio Flávio Pinto, em Belém. “Depois, encontrei minha turma em São Paulo, que eram os filhos da revista Realidade”, relata. Ele também lembra de Tarso de Castro, no Rio de Janeiro, que fez O Nacional e o Pasquim, além da turma da Caros Amigos.


“Minha turma, hoje, são vocês, que estão nesse tablado e nesse auditório”, diz. “Nós que pensamos em como fazer informação e jornalismo relevante nos dias de hoje. Meus heróis e inspiradores de outros tempos, atualmente, estão na blogosfera”, exalta. O desafio, segundo ele, é como transformar os blogs em jornalismo factual e reportagem. “Mesmo com o entrave da falta de financiamento, temos que pensar como dar menos opinião e reportar mais mais fatos, como a Agência Pública, a Fórum, o próprio Nassif, a Laura Capriglione e o Paulo Nogueira estão fazendo. Como dar ‘um plus a mais’ em algo que tem mostrado força e qualidade”.

Referência mundial, Marco Civil da Internet ainda está em disputa

Por Felipe Bianchi

As conquistas do Marco Civil da Internet e os desafios de sua regulamentação foram tema de discussão neste sábado (25), no II Encontro de Blogueiros e Ativistas Digitais de São Paulo. Renata Mielli, do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé; Veridiana Alimonti, do Coletivo Intervozes; e Ronaldo Mota, do blog Desenrola e Não Me Enrola compuseram a mesa, mediada por Eduardo Guimarães (Blog da Cidadania).

Considerada uma das legislações mais avançadas do mundo para o campo da Internet, a lei sancionada há praticamente um ano está em processo de regulamentação, que poderá garantir ou colocar em risco os direitos à liberdade de expressão e à privacidade. “O debate sobre o Marco Civil não é um debate técnico, como colocam os meios de comunicação”, defende Renata Mielli. “Esse é o expediente das elites para interditar debates públicos”.

Para ela, jornalistas e comunicadores se envolvem menos do que deveriam nessa discussão. “Nós, que atuamos em rede, precisamos estar inseridos nesse processo. A Internet é que permite estarmos aqui, reunidos num Encontro de Blogueiros e Ativistas Digitais, e que nos permitiu ter dado saltos quanto à pluralidade informativa, furando o bloqueio da mídia tradicional”.

A condição democrática, segundo a jornalista, é o que esteve em disputa no Marco Civil da Internet. “Houve uma ampla discussão sobre os direitos e deveres na Internet, mas não para criminalizar as pessoas, pois para isso há o Código Penal. A discussão tem que ser para garantir direitos”, diz. “Há setores econômicos muito poderosos no Brasil e no mundo interessados em cercear a rede, com a finalidade de assegurar mais lucros para seus negócios”.

A principal conquista da lei é o fato de colocar, de maneira clara, que a Internet é um direito de todos, avalia Mielli. Ao colocar o acesso à Internet como serviço essencial, a lei coloca o Estado como protagonista no combate ao déficit de acesso à banda larga no país.

O espírito da Internet

O revolucionário da Internet, de acordo com Veridiana Alimonti, é permitir que uma pessoa, em qualquer lugar do mundo, se comunicar com outra, em qualquer lugar do mundo, dependendo apenas da conexão, sem intermediários como os meios de comunicação tradicionais. Apesar disso, no ambiente digital, há outros intermediários em ação.



“Plataformas hegemônicas moldam o discurso de uma outra forma. São empresas como o Google, o Facebook e o YouTube”, diz. “Outra forma de controlar o acesso e o fluxo de conteúdo não depende só de sites e plataformas online, mas das próprias empresas de telecomunicações”.

A neutralidade da rede, assegurada na aprovação do Marco Civil da Internet, garante justamente a não-interferência dos proprietários da infraestrutura da Internet no fluxo de conteúdos que por ela transitam. “Há alguns exemplos clássicos, baseados na defesa de parceiros comerciais, como empresas de telecomunicações deteriorarem a conexão de um serviço como o Skype para favorecer empresas de telefonia fixa”.

Ela lembra o vídeo produzido pelo FreeNet? para ilustrar como as empresas de telecomunicações pretendiam derrubar a neutralidade da rede para transformar a Internet em uma espécie de TV por assinatura.



Sobre o possível acordo do governo brasileiro com o Facebook, Alimonti opina que é uma verdadeira 'bordoada' na sociedade civil que tanto lutou pelo Marco Civil. “O Facebook não é entidade beneficente que quer fazer projeto de inclusão digital. Isso se resolve é com política pública”, decreta. “O principal negócio do Facebook não é o patrocínio de posts, mas o acesso aos dados dos usuários. A privacidade, garantida pela lei, fica ameaçada com esse acordo”

Ronaldo Mota também chama a atenção para a questão do uso dos dados dos usuários. “A quebra da privacidade significa não só usar dados dos usuários para fins comerciais, mas também para fins políticos”, alerta. “O caso de Edward Snowden é emblemático. Ao trazer à tona o sistema de vigilância e espionagem da Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA), fica clara a importância da privacidade e da proteção dos dados”.

Está em curso, na Internet, uma consulta pública para regulamentar tanto o Marco Civil da Internet quanto a Lei de Proteção de Dados. “A participação da sociedade civil é fundamental para garantir e ampliar os direitos conquistados no Marco Civil”, opina Mielli.



Lei de meios e ativismo digital são receita para mídia democrática


Por Felipe Bianchi

A sigla PIG (Partido da Imprensa Golpista) não é exagerada. A afirmação é de Laura Capriglione, integrante dos Jornalistas Livres, e do professor Laurindo Leal Filho, o Lalo. Em debate no II Encontro de Blogueiros e Ativistas Digitais de São Paulo, no sábado (25), ambos falaram sobre as possibilidades para superar o cenário de monopólio midiático e democratizar os meios de comunicação no país.

“Tenho um otimismo grande sobre esse momento histórico que estamos vivenciando”, assinala Capriglione. “Há em curso uma revolução tecnológica gigantesca e há, também, profissionais e ativistas com vontade de fazer jornalismo, reportagem, fotografia, mesmo fora dos grandes veículos”.

Com passagens por grandes redações, como a do Estadão e a da Veja, a jornalista opina que esse ambiente de contrainformação nasce quando os movimentos sociais se dão conta de que manter uma assessoria de imprensa e enviar releases para a grande mídia é inútil, pois suas portas estão fechadas. “Primeiro, houve uma crítica feroz à mídia tradicional, que concebeu o apelido PIG, pelo seu comportamento monolítico e partidarizado”, sublinha. “É aí, inclusive, que surgem os chamados blogueiros sujos”.

Em um segundo momento, na avaliação de Capriglione, as pessoas perceberam que havia um espaço fértil para contranarrativas. “Essa é a novidade do momento que vivemos: se a Globo não publica, publicaremos nós. Os movimentos sociais, os comunicadores desempregados, os artistas e as pessoas que querem contar histórias passaram a usar a dinâmica das redes sociais para disseminar informação”.

Os Jornalistas Livres surgem nesse contexto. “A experiência do coletivo tem sido riquíssima nesse sentido”, avalia. Ela conta que, frente aos atos dos dias 13 e 15 de março (o primeiro por parte dos movimentos sociais e o segundo, contra o governo de Dilma Rousseff), foi decidido chamar uma reunião para articular uma cobertura colaborativa. “No susto, convocamos todos que estavam dispostos a contar o que aconteceria nessas manifestações. Reunimos 68 pessoas”, relata. “Hackeamos a lógica da mídia tradicional utilizando as redes e transmitindo conteúdo por mídias sociais e pela nossa página”.

Avanços do ativismo digital, atraso na regulação da mídia

Os avanços do ativismo e da comunicação digital, na visão de Lalo, contrasta com o recrudescimento do conservadorismo nos grandes meios de comunicação. “Às vezes me sinto nos anos 1960, quando o cerco da mídia ao então presidente João Goulart culminou no golpe militar”, diz. “A mídia trata Dilma da mesma forma que tratava Jango e, por isso, a sigla PIG não é exagero. A imprensa é golpista e está tentando derrubar Dilma, assim como tentou derrubar Lula”.

Por mais ricas que sejam as experiências das mídias alternativas – blogs, portais, redes e coletivos –, Lalo defende a regulação da mídia como condição primordial para a democratização do setor. “Se antes dizíamos 'reforma agrária na lei e na marra', hoje temos que exigir a 'reforma agrária do ar' [em referência ao espectro radioelétrico, ocupado pelas emissoras de radiodifusão] na lei e na marra. Na marra, estamos fazendo. Na lei, não”.

Ele lembra pesquisa feita recentemente pela Secretária de Comunicação da Presidência (Secom), que constatou a televisão como o principal meio de informação da grande maioria da população. “Depois da TV, ainda vem o rádio, que ninguém dá muita bola, mas que, em períodos eleitorais, tem papel decisivo. Todas as grandes rádios comerciais fazem oposição sistemática às políticas populares e aos movimentos sociais”, argumenta.

Por isso, Lalo defende uma política que combine esse avanço das novas mídias com a democratização dos meios de comunicação. “Essa democratização se dá em dois níveis: a lei de meios e o fortalecimento da comunicação pública”, aponta. No caso da comunicação pública, ele destaca a criação da EBC (Empresa Brasil de Comunicação) em 2007, mas lamenta a falta de projeção e aporte de recursos para alavancar o projeto a ponto de representar uma alternativa concreta “à Globo ou à Record”.

Em relação à lei de meios, o professor lamenta o atraso brasileiro em relação não só a países europeus e aos Estados Unidos, mas também aos vizinhos latino-americanos. “Estamos 80 anos atrasados em relação à Europa, mas também ficamos para atrás em relação a nações como o Equador, a Venezuela, a Bolívia, o Uruguai e a Argentina”, lista. “Todos esses países implantaram regulações de forma a ampliar a liberdade de expressão. Aqui no Brasil, quando falamos em regulação, já respondem que é censura. O debate não é fácil, mas temos que enfrentá-lo”.

Além da regulação econômica do setor, mencionada por Dilma Rousseff em sua campanha eleitoral,  Lalo frisa a importância de garantir conteúdos diversificados na mídia, o que só acontecerá com um marco regulatório que vá além da proposta inicial da presidenta. “A lei de meios implica na criação, por exemplo, de órgãos reguladores que façam a mediação entre a sociedade e o setor da comunicação. Se você se ofende com algo que vê na TV, hoje, não tem para quem reclamar”.

O modelo argentino é o principal exemplo a ser seguido, avalia. O aspecto central, segundo ele, é o desmonte do monopólio privado, dominado historicamente pelo grupo Clarín, no caso argentino. “A lei dividiu o espectro radioelétrico em três partes: mídia privada, mídias públicas e veículos comunitários”, explica. “Além de ampliar o mercado de trabalho, essa política dá voz a setores antes invisibilizados pela mídia”.


No Brasil, 19 anteprojetos de lei para o setor já foram elaborados desde a Constituição. Nenhum avançou. “Agora, nos cabe lutar pelo Projeto de Lei da Mídia Democrática, de Iniciativa Popular. A ideia é pressionar por uma mobilização e discussão nacional sobre o tema”, opina.

Comunicação como direito humano marca a abertura do #2BlogProgSP


Por Felipe Bianchi

“Os blogueiros têm desempenhado um papel fundamental na construção de uma outra narrativa e de uma outra interpretação do Brasil, diferente do que predomina nos grandes meios de comunicação”, afirmou Emiliano José, nesta sexta-feira (24), durante a abertura do II Encontro de Blogueiros e Ativistas Digitais de São Paulo.

O Secretário de Serviços de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações contou com a companhia de Simão Pedro, Secretário Municipal de Serviços da Prefeitura de São Paulo, e Altamiro Borges, presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé. O tema proposto pelo #2BlogProgSP, 'A comunicação como direito humano', foi o norte do bate-papo com mais de 70 jornalistas, blogueiros, ativistas digitais, sindicalistas e estudantes presentes na sede do SindSep - Sindicato dos Trabalhadores na Administração Pública e Autarquias do Munícipio de São Paulo.

Representante do Ministério das Comunicações, Emiliano José falou sobre a posição do ministro Ricardo Berzoini e explicou a agenda para a regulação da mídia. “Berzoini sabe que é absolutamente essencial abrir um amplo debate público sobre o tema. Não será apresentado nenhum projeto prévio e todos os setores serão convidados a enfrentar essa discussão”, diz. “Já ouvi ele afirmar isso, inclusive, em reunião com a Abert [Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, entidade patronal do setor]”.

De acordo com ele, deve ser estabelecido um cronograma de debates já a partir do primeiro semestre. “Além da discussão nacional em torno do da regulação do setor, há a pretensão, por parte do Ministério das Comunicações, de fazer um cotejamento em relação às experiências internacionais de regulação, como nos Estados Unidos, em Portugal e na Inglaterra, que deveria ser considerada 'bolivariana', já que regulou, recentemente, até a mídia impressa”, acrescenta.

Salientando que, se a Constituição fosse cumprida à risca, teríamos uma mídia muito diferente, o parlamentar acredita que o Projeto de Lei daMídia Democrática, de Iniciativa Popular, pode ser fundamental nesse processo. “A grande mídia brasileira sempre foi coerente, pois tem lado”, ironiza. “O que queremos é que, além dos atores da grande mídia, existam outros. Que tenhamos uma mídia que seja capaz de expressar a complexidade, a riqueza e a diversidade da sociedade brasileira”.

Desburocratização e políticas imediatas

Emiliano José aproveitou o Encontro para falar sobre o que o Ministério das Comunicações “pode e já está fazendo”, independente da regulação do setor. “Anunciaremos, nos próximos dias, três Planos Nacionais de Outorga: um para Rádios Comunitárias, um para Rádios e TVs educativas e um mais ousado, para Rádios Comunitárias em assentamentos quilombolas e indígenas”.

O Canal da Cidadania também está à disposição da sociedade, ressalta. “Em resumo, funciona assim: o prefeito pede o canal e aí, além do canal da Prefeitura, recebe mais dois canais para a sociedade civil, que serão ocupados de acordo com determinados critérios. Segundo ele, 320 municípios solicitaram o Canal da Cidadania, menos de 10% do que está disponível. “A demanda, surpreendentemente, ainda é baixa. O de Fernando Haddad, no entanto, já está em andamento”, registra.

A ideia dessas iniciativas, segundo ele, é desburocratizar a pasta e acabar com a “cultura do não” que impera no Ministério. “De 33 documentos necessários para outorgas de rádios comunitárias, diminuímos para 10”, exemplifica. Apesar dos avanços pontuais, Emiliano José admite que a luta para regular o setor é árdua e só a pressão da sociedade civil pode chacoalhar o governo. “Encontros como esse são essenciais pelo que representam de densidade na formulação e compreensão desse processo.”

São Paulo digital

Apesar de atuar em áreas diversas, como a limpeza, a coleta e a iluminação da cidade, Simão Pedro, secretário de Serviços do município, tem muito a dizer sobre comunicação: sob seus cuidados, as Praças Digitais do projeto WiFi Livre SP levaram conexão banda larga gratuita e de qualidade para 120 praças de São Paulo.



“Quando lançamos o projeto, fomos ridicularizados e nos diziam que era um projeto impossível”, recorda. “Imaginamos implantar WiFi grátis em cinco ou seis praças, de início. Hoje, são 120, da aldeia guarani em Parelheiros até a distante Marsilac, algo único no mundo”, assinala. “Temos discutido muito como ampliar ainda mais, mantendo a qualidade que é oferecida".

Além de fornecer condições para o acesso à Internet, Simão Pedro opina que a novidade pode ser uma grande ferramenta para a democratização da comunicação: “Uma de nossas metas é estimular a realização de fóruns, debates e aulas públicas nestes espaços”.

Ele ainda opina que o monopólio da mídia um instrumento estratégico para as classes dominantes. “Monopolizar a comunicação garante a disseminação das ideias dominantes que, como sabemos, não atendem aos interesses da maioria do povo brasileiro”, argumenta. “Daí a importância de nos reunirmos no II Encontro de Blogueiros e Ativistas Digitais de São Paulo e debatermos a democratização do setor”.

Mídia brasileira nega os direitos humanos

Para Altamiro Borges, a atuação sem regras e sem limites da mídia no Brasil constitui uma verdadeira negação dos direitos humanos. “Para que a comunicação seja um direito, é preciso que haja liberdade de expressão para todos e todas”, defende. “O que o monopólio de mídia faz é castrar a liberdade de expressão”.

Para elucidar, o jornalista lista alguns movimentos dos grandes meios de comunicação. O primeiro é tornar invisível as lutas dos trabalhadores e criminalizar os movimentos sociais. “Tivemos, nesta sexta-feira, 50 mil professores na Praça da República, mas a greve da categoria é ignorada pela mídia. Quando mencionada, é para reclamar que está congestionando o trânsito, mas se for por impeachment, não tem esse problema”, destaca. “Na greve do Paraná, o mesmo expediente: o estado sumiu do mapa de repente, até porque a greve era contra o tucano Beto Richa”.

Além disso, o tema da terceirização também ajuda a compreender a postura serviçal da mídia. “Editoriais da Folha, do Estadão e de O Globo defendem a terceirização mentindo, dizendo que a lei melhora a situação do terceirizado. Muito jornalista que é pessoa jurídica, inclusive, que já é terceirizado, repete esse discurso imbecil”, exclama.

O episódio da condecoração a João Pedro Stedile, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), por parte do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, também foi lembrado. “A Veja e o Jornal da Band produziram matérias 'escrotas', chamando Stedile de bandido”, critica. “Stedile foi recebido pelo Papa Francisco no Vaticano. Quero ver o Papa receber um Mesquita ou um Frias”.

Outro elemento que Altamiro Borges traz à tona é o que Claudio Lembo nomeou 'ditadura da toga', ou seja, uma ditadura do Poder Judiciário. “A presunção da inocência, que está na Constituição, vem sendo substituída, quando convém, pela presunção da culpa”, sendo que “a mídia tem papel crucial nesse processo”. Os meios de comunicação, de acordo com ele, destruíram a imagem de Marice Correa de Lima, cunhada de João Vaccari. Neto. “O que Moro, premiado pela Rede Globo, fez com a cunhada de Vaccari, prendendo-a sem nenhuma prova, é um crime. E agora? Como isso passa batido?”, questiona.

Por fim, a questão da corrupção. “O problema da mídia no combate à corrupção é simples: é um combate falso e seletivo”, sentencia. “A corrupção tem que ser combatida. Tem que apurar e prender. Se alguém se embasbacou com o poder, ergueu o nariz e roubou, azar”.

Os casos do HSBC e da Operação Zelotes ilustram a tese do blogueiro. “Tivemos, recentemente, a denúncia na França da sonegação de bilhões de dólares através de um esquema do HSBC na Suíça. Muitos brasileiros estão envolvidos. Alguem vê destaque na mídia? Os herdeiros da Folha de São Paulo, gente da família Saad (Band) e gente ligada à Veja estão na lista”. Na Zelotes, de novo, o mesmo roteiro: “Trata-se de um mecanismo impressionante de sonegação e desvio de dinheiro. A RBS, filiada à Globo, está na lista. Cadê a repercussão da corrupção?”.

Pressão pela democratização

Assim como Emiliano José, Altamiro Borges aposta na pressão dos movimentos sociais para forçar a pauta da democratização da comunicação.“Vivemos uma situação contraditória”, opina. “Dentro do governo, as condições nunca foram tão boas para levar a cabo a regulação da mídia. O time montado no Ministério das Comunicações, no Ministério da Cultura e na Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom) são espetaculares e estão a fim de enfrentar esse debate, atrasadíssimo no país. Porém, ao mesmo tempo, a situação política é a mais desfavorável possível – inclusive, por culpa do governo”, pontua. “Por não disputar a hegemonia de ideias na sociedade, permitiu-se a eleição do Congresso mais conservador da história”.


O que fazer? Aumentar muito a pressão e intensificar a luta. “Descomemorar o aniversário da Globo (dia 26 de abril), coletar assinaturas para o Projeto de Lei da Mídia Democrática e mobilizar a sociedade para uma nova Conferência Nacional da Comunicação (Confecom) são alguns caminhos”, finaliza.

Encontro segue no sábado (25)

O #2BlogProgSP continua no sábado, com transmissão feita pela TVT e reproduzida nesta página e no site do Barão de Itararé (http://www.baraodeitarare.org.br). Confira a programação do segundo dia do evento:

9h – Democratização da Comunicação Social, seus impactos e sua importância para a democracia
  • Guilherme Boulos – coordenador nacional do MTST
  • Laura Capriglione – Jornalistas Livres
  • Laurindo Leal Lalo Filho – Sociólogo, jornalista e professor de jornalismo
  • Mediadora: Conceição Oliveira – Blog Maria Frô

10h30 – Mesa: Marco Civil da Internet: regulamentação e desafios
  • Renata Mielli – Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé
  • Veridiana Alimonti – Intervozes
  • Ronaldo Matos – Blog Desenrola e Não Me Enrola
  • Mediador: Eduardo Guimarães – Blog da Cidadania

13h – ALMOÇO

14h – Desconferências – Tema: Direitos Humanos no Brasil
(serão realizadas simultaneamente)

1ª: A periferia e o jornalismo comunitário
  • Aline e Thiago – Periferia em Movimento
  • Thais – Desenrola e Não Me Enrola
  • Paulo Ferraz Simões – Rádio Comunitária Itaquera
  • Mediador: Renato Rovai – Revista Forum 

2ª: Mídia e minorias: questões de gênero e racismo
  • Márcia Cabral – ativista do Movimento Negro e LGBT
  • Rachel Moreno – Psicóloga e pesquisadora
  • Dennis de Oliveira - Quilombação
  • Mediadora: Preta Rara – Nação Hip Hop

3ª: Mídia e a violência de Estado
  • André Caramante – Reporter investigativo, atua com ênfase nas áreas de segurança pública e direitos humanos.
  • Marcio Sotelo Felippe – Jurista
  • Adriano Diogo – Comissão Estadual da Verdade da Democracia "Mães de Maio"
  • Mediadora: Lira Alli - Levante Popular da Juventude

15h30 – Fechamento das desconferências

15h45 – Mesa final: Mídia e conjuntura
  • Rodrigo Vianna – Blog Escrevinhador
  • Luís Nassif – Portal GGN
  • Palmério Dória – Jornalista e escritor
  • Mediadora: Conceição Lemes – Blog da Saúde (Viomundo)

18h – ENCERRAMENTO

*sujeita a alterações

Local
Sindsep – Sindicato dos Trabalhadores na Administração Pública e Autarquias do Município de São Paulo.
Rua Barão de Itapetininga, 163 – 2º andar
Centro de São Paulo.

Assista ao vivo o #2BlogProgSP

Assista ao vivo, a partir das 19h, o II Encontro Estadual de Blogueiros e Ativistas Digitais de SP.





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Mídia e democracia



Quando se fala em democratização dos meios de comunicação no Brasil, há sempre uma desvirtuação do tema. Há sempre aqueles que levantam para dizer que o governo quer censurar os meios de comunicação, o que é uma coisa muito diferente. Mas o tema precisa ser discutido de uma maneira mais democrática, mais inteligível ao cidadão. 

Esse também é um dos pontos abordados na Plataforma CUT da Classe Trabalhadora e merece uma discussão mais profunda. E sim, é preciso aprovar e implementar um novo marco regulatório para as comunicações no Brasil, a partir do Projeto de Lei por uma Mídia Democrática, construído coletivamente pelos movimentos sociais. 

Esse discurso de censura só interessa aos grandes grupos que controlam a mídia no Brasil, os mesmos que adotam um discurso de ataque ao governo federal. Neste sentido, é preciso estabelecer critérios democráticos e transparentes para a concessão de radiodifusão, renovações e financiamento, e maior agilidade nos processos. 

Também é fundamental garantir mecanismos de fiscalização, com o controle público e participação popular em todos os processos de outorgas. Além disso, há a necessidade de fortalecer o sistema público de comunicação, em especial, a TV pública.

Do outro lado, também é preciso mudança com a regulamentação da publicidade, com definição de novos critérios e mecanismos de transparência. Ou seja, o governo precisa socializar sua verba de publicidade e não concentrar em alguns veículos. 

A democracia deve chegar também às rádios e TVs comunitárias, além das garantias à produção independente. No mesmo sentido, deve-se buscar a implantação de políticas de inclusão digital e de acessibilidade, com universalização da internet. E por falar nela, também é preciso garantir a regulamentação do Marco Civil da Internet, com a participação da sociedade civil. 

Um dos mais importantes pontos dessa discussão é abrir espaço para que os movimentos sociais possam participar do debate sobre o artigo 15  do Marco Civil, em relação à guarda e a proteção dos dados. 

Discutir a comunicação social é discutir a democracia em si. Para que as garantias da sociedade sejam mantidas e possa se avançar é preciso que todos os mecanismos de transparência nesse debate sejam debatidos. E quem deve puxar esse debate é, sem dúvida, o movimento sindical, para que a sociedade seja representada nesse espaço democrático de discussão. 

Democracia na mídia, já!


O apoio da mídia ao golpe da terceirização


A votação, na semana passada, do PL 4330, que permite a terceirização ampla, geral e irrestrita no país, foi mais uma demonstração de como o discurso da mídia está perfeitamente alinhado com a maioria conservadora da Câmara Federal e com os empresários. Apesar de ser a primeira votação, o noticiário, de forma unânime, deu a entender que o fato já estava consumado.

Os jornais O Globo e Folha de São Paulo, os dois maiores do país, comemoraram a aprovação. Enquanto as entidades empresariais, como a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e as Confederações Nacionais da Indústria e da Agricultura têm espaço privilegiado na mídia, os trabalhadores são mostrados como selvagens se engalfinhando em brigas nas ruas. Nos dois grandes jornais, o noticiário praticamente não dá espaço ao contraditório, às denúncias das entidades representativas dos trabalhadores sobre o que representa a aprovação do projeto.

Além de minimizar e até omitir a voz dos trabalhadores prejudicados, a mídia esconde a existência do Projeto de Lei 1621/07, do deputado Vicentinho (PT-SP), que propõe "a regulamentação da terceirização desde que haja igualdade de direitos entre terceirizados e efetivos, assegura a participação dos sindicatos em negociações prévias, proíbe a terceirização desmedida, estabelece a responsabilidade solidária, enfim, assegura a dignidade no trabalho". No projeto, o deputado mostra que a terceirização provoca "demissões em massa de empregados regularmente contratados para substituí-los por terceirizados, com salários mais baixos. 

Há muito tempo o setor de telecomunicações terceiriza ilegalmente atividades fins das empresas. No Rio de Janeiro, por exemplo, todo o teleatendimento e a rede externa da Oi e demais operadores, responsável pela instalação e manutenção da telefonia fixa e outros serviços, são terceirizados. Os trabalhadores são submetidos a condições análogas à escravidão, com salários e benefícios irrisórios e condições de trabalho desumanas.

A postura dos principais jornais e redes de televisão do país deixa claro, mais uma vez, a necessidade imperiosa de democratizar a mídia. Uma democratização que bate de frente com os poderosos interesses do empresariado e seus representantes, como o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que já manifestou sua posição contrária.

Quem detém o monopólio da mídia tudo faz, e continuará fazendo, para impedir qualquer modificação no rumo da democratização das comunicações brasileiras. Insistem em associar regulação com censura, embora saibam que a maior parte dos países desenvolvidos regula as suas mídias. O fato é que no Brasil vivemos como escravos de uma mídia ardilosa e mentirosa, que ajudou a eleger um Congresso extremamente conservador e agora quer rasgar a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), tendo como primeiro ensaio o PL da terceirização. 


Concentração da mídia é ameaça à democracia

Abertura do 2º ENDC

“Comunicação é direito e o Estado deve garantir esse direito”, afirma Rosane Bertotti, no 2º ENDC, em Belo Horizonte

Por Vanessa Ramos e Érica Aragão

O 2º Encontro Nacional pelo Direito à Comunicação (ENDC), que aconteceu de 10 a 12 de abril, em Belo Horizonte, Minas Gerais, reuniu cerca de 700 pessoas neste sábado (11), entre representantes dos movimentos sociais, sindical, do governo, estudantes, acadêmicos e diversos coletivos e organizações que debatem o tema comunicação.

A mesa de abertura trouxe à tona o cenário internacional e os desafios do Brasil para enfrentar a regulação democrática da mídia e, ao mesmo tempo, a garantia do direito à comunicação.

A coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação e secretária nacional de Comunicação da CUT, Rosane Bertotti, destacou que o tema se torna ainda mais importante na conjuntura atual, momento em que a classe trabalhadora está tendo seus direitos ameaçados. “A liberdade de expressão nos permitirá fortalecer a democracia, o direito à voz e à diversidade”.

Na mesma linha, a presidenta da CUT Minas Gerais, Beatriz Cerqueira, fez referência à cobertura da grande mídia frente ao momento político pelo qual a classe trabalhadora está passando com a aprovação do PL 4330/04, que precariza as relações de trabalho e abre as portas para a terceirização desenfreada, permitindo esta prática na atividade-fim da empresa. “A crise deve ser transformada em estímulo”.

Diante das cobranças, o secretário de Serviços de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações, Emiliano José, garantiu que o governo irá promover neste ano o debate sobre a regulação da mídia no Brasil. “Todos os setores da sociedade serão chamados a participar dos espaços de discussão e ali poderão responder qual marco regulatório querem para o País”, afirmou.

Emiliano fez referência à mídia hegemônica brasileira, também considerando-a como um polo político. “Eu não acredito na auto-regulação da mídia sobre si mesma. O estado democrático é quem deve regular a mídia”, acredita.

Em ironia às críticas feitas ao Brasil e a países da América Latina por setores de direita da sociedade, o representante do Ministério das Comunicações fez menção à América do Norte. “Os EUA têm uma legislação muito mais rigorosa do que a nossa no setor e por que, então, não são chamados de bolivarianos ou censuradores?”, questionou.

Luta mundial

O consultor da Unesco e diretor-executivo do Centro de Direitos e Democracia, Toby Mendel, destacou que a liberdade de expressão é também o direito de receber e buscar informações. “Na lei de direito internacional, o que protege é o fluxo de informações e ideias. Quando temos uma restrição maior do que o benefício, então ela não é legítima”.

Para Mendel, é preciso existir uma relação de equilíbrio. “O debate público é essencial e se observarmos a democracia em todo o mundo, veremos que todos os lugares têm um órgão ou algum sistema de regulação”, lembra.

O consultor comentou sobre o Canadá como país de controle. “Se observarmos a regulamentação da transmissão por lá existem três condições essenciais, que são o licenciamento, a regulamentação de conteúdo e a aplicação de regras legislativas ou do país ao transmissor”.

Direitos humanos

Rosane Bertotti ressaltou que a comunicação deve ser vista como um direito humano.  “Quando a comunicação é tratada como um direito, o Estado tem que ser garantidor deste direito.  E defender direito é defender a democracia”.

Em consonância com a dirigente da CUT, o professor e pesquisador da Universidade de Buenos Aires e da Universidade Nacional de Quilmes, Martín Becerra, questionou se as organizações presentes estabelecem a regulação dos meios como um direito humano. Para ele, isso precisa ser discutido e é questão chave no que tange à regulamentação. “A liberdade de comunicação deve ser como direito social e não como um direito dos emissores. Isso supera várias barreiras de caráter coorporativo”, opina.

Becerra destacou avanços na Ley de Medios, aplicada em 2009 pelo governo da presidenta Cristina Kirchner para romper com o oligopólio midiático, no qual o Grupo Clarín era um dos principais representantes. “A articulação da sociedade civil, que sustenta a sociedade, é de extrema importância em todo esse processo. É preciso sempre avaliar se a lei se aplica igualmente a todos os atores sociais”.

Para Rosane, é fundamental que existam instrumentos de comunicação para elevar a voz da sociedade. “Neste sentido nossas rádios comunitárias, TVs comunitárias e a nossa estrutura de comunicação pública não podem ser só retóricas, elas devem ser parte da estratégica na construção da mídia democrática”.

Ao final da mesa, Becerra fez elogios ao envolvimento das organizações no Brasil e observou que a regulação dos meios não se refere somente à lei, ao dispositivo legal. “Mais respeitável do que isso é a consciência social e política que se tem de que os meios não são produzidos com uma concepção imaculada. Ou seja, a imaculada concepção dos meios de comunicação tem sido colocada em crise. E essa crise é muito bem-vinda”, concluiu.

Fonte: CUT

Carta de Belo Horizonte: "Regula Já!, nossa luta é por mais democracia e mais direitos!"



"Em um momento em que o povo brasileiro e suas instituições democráticas enfrentam uma conjuntura política e econômica adversa, mais do que nunca, levantamos a bandeira: por mais diversidade e pluralidade de vozes na mídia".

Com a participação ativa de 682 inscritos, o 2º Encontro Nacional pelo Direito à Comunicação (ENDC) aprovou, na tarde deste domingo (12/4), a Carta de Belo Horizonte. O documento reafirma a luta pela democratização da comunicação como pauta aglutinadora e transversal, além de conclamar as entidades e ativistas a unirem forças para pressionar o governo a abrir diálogo com a sociedade sobre a necessidade de regular democraticamente o setor de comunicação do país.

Rosane Bertotti, coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), comemorou o resultado do evento, que reuniu ativistas, estudantes, militantes, jornalistas, estudiosos e pesquisadores da comunicação, representantes de entidades e coletivos e autônomos de todo o Brasil. "Nosso encontro mostrou que a luta por uma comunicação democrática, inclusiva, plural está mais ativa e é mais necessária do que nunca. E mais do que isso, que os movimentos estão dispostos a cobrar do governo que paute essa questão a coloque na agenda dos debates estratégicos para o país".

Leia o documento na íntegra aqui.

Fonte: FNDC

A 'descomemoração' dos 50 anos da Globo


Por Altamiro Borges

A Rede Globo prepara uma overdose de eventos e lançamentos para comemorar os seus 50 anos de existência – em 26 de abril. O objetivo é reforçar a ideia do império midiático imbatível e onipresente, que faz a cabeça e o coração dos brasileiros. A emissora, porém, pode sofrer uma baita surpresa. De tanto manipular informações e deformar valores nestas cinco décadas, ela é hoje alvo de crescentes críticas da sociedade. Em todas as manifestações populares, seja numa passeata de professores em greve ou numa plenária dos movimentos sociais, o grito mais ouvido é o do “Fora Rede Globo”. Nesta quarta-feira, 1º de abril, “Dia da Mentira”, já houve um “esquenta” dos atos programados contra a emissora em abril. Agindo como a máfia, o restante da mídia fez silêncio. Mas as redes sociais ajudaram a informar e a criar o clima da “descomemoração”.

Segundo relato do site Vermelho, o maior protesto ocorreu diante da sede central da emissora no Rio de Janeiro. “A manifestação foi convocada por jornalistas, blogueiros e diversas lideranças de mídia alternativa, entre os quais o Barão de Itararé. Os manifestantes empunharam cartazes, bandeiras e faixas com os dizeres: ‘O povo não é bobo, abaixo a Rede Globo’ e ‘Globo mente’… A banda do Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro (Sindipetro-RJ) agitou o local. O protesto também contou com a participação do grupo independente de teatro, que atua nas ruas de Santa Teresa, que encenou o enterro da Globo e da Operação Zelotes, deflagrada pela Polícia Federal que investiga os esquemas de sonegação fiscal”. Também ocorreram protestos na sede da emissora em São Paulo e diante do edifício da RBS, afiliada da Rede Globo no Rio Grande do Sul.

Em vários Estados, reuniões já estão agendadas para organizar novos protestos para a semana do aniversário da emissora. No Rio de Janeiro, ela ocorrerá em 17 de abril, no auditório do Sindipetro. Em São Paulo, ativistas digitais e entidades que lutam pela democratização da comunicação já realizaram três reuniões preparatórias. Entre outras iniciativas previstas, ficou acertado promover debates em faculdades, sindicatos, coletivos culturais e associações comunitárias; intensificar a denúncia contra o império global nas redes sociais; e promover um grande ato em 26 de abril. Já a Jornada de Luta da Juventude, que reúne mais de 50 entidades juvenis, aprovou em sua plenária nacional na semana passada concentrar suas energias na preparação dos atos de “descomemoração”.

Quem tiver mais relatos sobre a organização dos protestos nos 50 anos da Rede Globo, por favor, enviar para o blog.



Blogueiros e colunistas brasileiros sofrem ameaças virtuais e presenciais

Enderson Araújo está com tanto medo de ser assassinado pela polícia, que ele teve que fugir de casa e está relutante em falar ao telefone.

Araújo é o blogueiro brasileiro que está por trás do Mídia Periférica, um blog alimentado por jovens jornalistas do nordeste da cidade de Salvador, que foca na cobertura de notícias de comunidades pobres que não são alvo da mídia tradicional.

Depois que ele escreveu sobre uma onda de jovens mortos em tiroteios policiais, no último mês, um policial o abordou com um aviso de arrepiar.

“Pare de mover seus dedos e criticar os que realmente promovem sua segurança, ou então, você pode acabar não tendo nenhuma”, o policial, que estava uniformizado mas sem nome de identificação, disse a ele.

Araújo juntou suas coisas e, três dias depois, estava em outro estado.

“Eu estava escrevendo sobre batidas policiais e assassinatos em que todas as vítimas eram jovens negros”, o jornalista de 23 anos disse ao Comitê de Proteção ao Jornalista (CPJ), através de pequenas pílulas via telefone e mensagem de texto de uma localização não identificada.

A polícia militar do estado da Bahia disse ao CPJ que não recebeu nenhuma reclamação formal do jornalista, e afirmou que estão investigando os assassinatos dos jovens, 13 dos quais aconteceram durante um tiroteio com agentes da lei no dia 6 de fevereiro, em Salvador.

Isso é pouco confortável para Araújo, mas ao menos ele sabe de onde as ameaças estão vindo.

Ana Freitas não tem a mesma sorte.

Freitas, jornalista de 26 anos, está sendo assediada quase diariamente desde que escreveu sobre machismo e misoginia em páginas abertas da internet brasileira.

O texto de Freitas foi publicado em 2 de fevereiro no Brasil Post, afiliada brasileira do Huffington Post, e mesmo que ela não tenha mencionado algum site ou fórum especifico, se tornou rapidamente um alvo, ela afirmou ao CPJ por telefone.

Usuários anônimos de um fórum do site 4chan abusaram e a ameaçaram. Os incidentes, que aconteceram no decorrer de dias, forçaram-na a fechar algumas de suas contas nas redes sociais e mudar as configurações de outras. Depois dela ter aceitado por engano um convite para um evento do Facebook, seus agressores encorajaram uns aos outros a atacá-la no evento, Freitas disse ao CPJ.

Ela cancelou seus planos, mas os abusos continuaram, e depois de alguém descobrir e publicar seu endereço, ela disse que foram enviados fezes, larvas, brinquedos sexuais e outros objetos através do correio.

Freitas disse que apresentou um relatório sobre o abuso na Delegacia da Mulher, depois de uma delegacia normal tê-la tratado de forma rude.

No entanto, sua situação melhorou apenas depois de O Estado de S.Paulo ter publicado seu artigo sobre o assunto: algo do que ela falou assustou os usuários do 4chan.

“Eu não estou 100% a salvo, minha vida gira em torno disso”, afirma. “Eu não saio sozinha se não é necessário, não dou nenhuma pista de onde estou, não posto fotos. Eu me sinto um pouco mais segura agora, mas estou sempre tentando seguir rotinas diferentes.”

Outro jornalista brasileiro que recebe ameaças constantes é Leonardo Sakamoto, que estuda e denuncia casos de trabalho escravo por meio da ONG Repórter Brasil. Recentemente, o texto que publicou em seu blog sobre a Lei de Acesso à Informação e a lista suja do trabalho escravo, gerou burburinho e irritou muita gente.

“Em resposta à atuação da Repórter Brasil, na investigação e denúncia de casos de trabalho escravo contemporâneo e tráfico de seres humanos, e do meu blog, no acompanhamento de violações aos direitos humanos, uma onda de ataques começou nas redes sociais e em sites ligados a ultraconservadores, fundamentalistas religiosos e grupos contrários ao combate à escravidão. As campanhas de difamação e calúnia tentaram primeiro desqualificar o trabalho da organização. Isso alimentou os malucos de plantão que já tentaram, em mais de uma ocasião, me agredir fisicamente na rua. Daí vieram ataques mais pesados e ameaças. Estou em contato com o Ministério Público Federal e outras instituições da sociedade civil daqui e do exterior para o devido encaminhamento”, declarou o jornalista em nota.

Segundo Sakamoto, a Repórter Brasil é vista como um problema para os ultraconservadores que ainda são a favor do escravismo, e quando as denúncias são divulgadas, esse público “sai do armário” e expõe suas ameaças e mensagens ódio. O jornalista ainda afirma que todo esse quadro é muito mais um resultado da atual conjuntura pela qual o Brasil passa do que das ações da Repórter Brasil em si.

Em nenhum dos três casos os autores das ameaças sofreram qualquer consequência.

Fonte: ABRAJI

Um macaco teria erguido um império nas condições dadas a Roberto Marinho pela ditadura em troca de apoio político


Por Paulo Nogueira

De tanto tratar os brasileiros como idiotas, a Globo parece que passou realmente a acreditar que somos todos imbecis.

É o que sugere um editorial a propósito da liberdade de expressão.

Nele, os Marinhos atacam, furiosamente, a regulação da mídia. E se colocam na posição de campeões do “jornalismo independente, que não vive de verbas oficiais”.

Pausa para gargalhar, e um segundo a mais para lembrar Wellington: quem acredita naquilo acredita em tudo.

Cada tijolo da Globo é, de alguma forma, produto de verbas oficiais – e mais incontáveis mamatas e privilégios que a empresa ganhou na ditadura militar e preservou intactos, numa aberração, nestes anos todos de democracia restabelecida.

Um macaco teria erguido um império nas condições dadas a Roberto Marinho pela ditadura em troca de apoio político.

Financiamentos diversos, publicidade copiosa dia após dia, complacência na cobrança de impostos – em suma, foi um empreendimento que é o oposto do que prega o capitalismo real. Não havia risco. Estava tudo garantido.

Roberto Marinho recebeu muito da ditadura e deu muito a ela. É expressivo o depoimento do general presidente Médici, em 1972: “Sinto-me feliz todas as noites quando assisto TV porque no noticiário da Globo o mundo está um caos, mas o Brasil está em paz… É como tomar um calmante após um dia de trabalho …” (Este Brasil paradisíaco subitamente renasceria, agora, caso Aécio tivesse vencido.)

As facilidades acabariam vindo de todos os lados.

No Conversa Afiada, Paulo Henrique Amorim lembra, hoje, como foi construído o Projac, o monumental estúdio da Globo.

Como em tudo, dinheiro público – e não as reservas formidáveis da família Marinho.

Num perfil sobre Roberto Marinho, o acadêmico Gabriel Collares Barbosa, da UFRJ, fala com minúcias do Projac.

“Outro fato que merece registro se refere a construção do Projac. Com 1.300.00 m², o Projac, em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, é o maior centro de produção da América Latina e foi projetado para abrigar superestúdios, módulos de produção e galpões de acervo.

Ao todo são quatro estúdios, de 1000m² cada, fábrica de cenários, figurinos, cidades cenográficas, centro de pós-produção e administração.

O que não é dito à população é que o Projac foi construído em uma área reservada pelo governo do Rio de Janeiro para a construção de casas populares.

Roberto Marinho humildemente solicitou à prefeitura uma autorização para construir sua 'casinha' popular. Com a autorização em mãos, Roberto Marinho indevidamente começou a construção do Projac utilizando recursos levantados em empréstimos com a Caixa Econômica Federal para pagamento em dez anos.

Podemos especular que a quitação do débito foi pago com propaganda da CEF na Rede Globo.

Uma ação popular exigindo a devolução desse dinheiro foi impetrada na justiça pois a Caixa Econômica é acusada de ter feito uma operação fora da rotina, com juros abaixo do mercado. O valor desse empréstimo atualizado com juros e correção monetária chega hoje a 37 milhões de dólares.”

A maneira como a Globo se serviu de bancos públicos foi imortalizada, em 1983, pelo Pasquim.

O Pasquim noticiou dois empréstimos a juros maternos que a Globo conseguiu com o Banerj, o Banco do Estado do Rio.

O Pasquim mostrou que a Globo ganharia um dinheiro considerável caso simplesmente pegasse o dinheiro dos empréstimos e o aplicasse no próprio Banerj.

Roberto Marinho foi chamado, pelo Pasquim, de “o maior assaltante de bancos do Brasil”.

“Nenhuma outra quadrilha, inclusive movimentos terroristas, lucrou tanto no negócio de assaltos a bancos como a quadrilha da Rede Globo”, escreveu o Pasquim.

O diretor superintendente do Banerj, Miguel Pires Gonçalves, acabaria depois virando superintendente da Globo. (Filho de um general da ditadura, Gonçalves acabaria por ser peça chave na manipulação do debate entre Collor e Lula na Globo, em 1989.)

Pois é esta Globo que, num editorial, desce à infâmia e se proclama símbolo do “jornalismo sem verbas oficiais”.

Talvez a Globo considere que os 500 milhões de reais anuais que vem recebendo há tempos das estatais federais – mesmo com uma brutal queda da audiência — sejam pouca coisa.

Ou, então, o que é mais provável, ache que somos todos estúpidos para cair na lorota cínica de que é uma empresa que ficaria de pé sem as mil-e-uma incursões ao dinheiro público.