Por Felipe Bianchi
As conquistas do Marco Civil da Internet e os desafios de sua
regulamentação foram tema de discussão neste sábado (25), no II Encontro de
Blogueiros e Ativistas Digitais de São Paulo. Renata Mielli, do Centro de
Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé; Veridiana Alimonti, do Coletivo
Intervozes; e Ronaldo Mota, do blog Desenrola e Não Me Enrola compuseram a mesa, mediada por
Eduardo Guimarães (Blog da Cidadania).
Considerada uma das legislações mais avançadas do mundo para
o campo da Internet, a lei sancionada há praticamente um ano está em processo
de regulamentação, que poderá garantir ou colocar em risco os direitos à
liberdade de expressão e à privacidade. “O debate sobre o Marco Civil não é um
debate técnico, como colocam os meios de comunicação”, defende Renata Mielli.
“Esse é o expediente das elites para interditar debates públicos”.
Para ela, jornalistas e comunicadores se envolvem menos do
que deveriam nessa discussão. “Nós, que atuamos em rede, precisamos estar
inseridos nesse processo. A Internet é que permite estarmos aqui, reunidos num
Encontro de Blogueiros e Ativistas Digitais, e que nos permitiu ter dado saltos
quanto à pluralidade informativa, furando o bloqueio da mídia tradicional”.
A condição democrática, segundo a jornalista, é o que esteve
em disputa no Marco Civil da Internet. “Houve uma ampla discussão sobre os
direitos e deveres na Internet, mas não para criminalizar as pessoas, pois para
isso há o Código Penal. A discussão tem que ser para garantir direitos”, diz.
“Há setores econômicos muito poderosos no Brasil e no mundo interessados em
cercear a rede, com a finalidade de assegurar mais lucros para seus negócios”.
A principal conquista da lei é o fato de colocar, de maneira
clara, que a Internet é um direito de todos, avalia Mielli. Ao colocar o acesso
à Internet como serviço essencial, a lei coloca o Estado como protagonista no
combate ao déficit de acesso à banda larga no país.
O espírito da Internet
O revolucionário da Internet, de acordo com Veridiana
Alimonti, é permitir que uma pessoa, em qualquer lugar do mundo, se comunicar
com outra, em qualquer lugar do mundo, dependendo apenas da conexão, sem
intermediários como os meios de comunicação tradicionais. Apesar disso, no
ambiente digital, há outros intermediários em ação.
“Plataformas hegemônicas moldam o discurso de uma outra
forma. São empresas como o Google, o Facebook e o YouTube”, diz. “Outra forma
de controlar o acesso e o fluxo de conteúdo não depende só de sites e
plataformas online, mas das próprias empresas de telecomunicações”.
A neutralidade da rede, assegurada na aprovação do Marco
Civil da Internet, garante justamente a não-interferência dos proprietários da
infraestrutura da Internet no fluxo de conteúdos que por ela transitam. “Há
alguns exemplos clássicos, baseados na defesa de parceiros comerciais, como
empresas de telecomunicações deteriorarem a conexão de um serviço como o Skype
para favorecer empresas de telefonia fixa”.
Ela lembra o vídeo produzido pelo FreeNet? para ilustrar como
as empresas de telecomunicações pretendiam derrubar a neutralidade da rede para
transformar a Internet em uma espécie de TV por assinatura.
Sobre o possível acordo do governo brasileiro com o Facebook,
Alimonti opina que é uma verdadeira 'bordoada' na sociedade civil que tanto
lutou pelo Marco Civil. “O Facebook não é entidade beneficente que quer fazer
projeto de inclusão digital. Isso se resolve é com política pública”, decreta.
“O principal negócio do Facebook não é o patrocínio de posts, mas o acesso aos
dados dos usuários. A privacidade, garantida pela lei, fica ameaçada com esse
acordo”
Ronaldo Mota também chama a atenção para a questão do uso dos
dados dos usuários. “A quebra da privacidade significa não só usar dados dos
usuários para fins comerciais, mas também para fins políticos”, alerta. “O caso
de Edward Snowden é emblemático. Ao trazer à tona o sistema de vigilância e
espionagem da Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA), fica
clara a importância da privacidade e da proteção dos dados”.
Está em curso, na Internet, uma consulta pública para
regulamentar tanto o Marco Civil da Internet quanto a Lei de Proteção de Dados.
“A participação da sociedade civil é fundamental para garantir e ampliar os
direitos conquistados no Marco Civil”, opina Mielli.